terça-feira, 15 de novembro de 2016

Restrição calórica X jejum intermitente

Em outro esclarecedor post, o Dr. Jason Fung explica a diferença da restrição calórica e o jejum intermitente, bem como os benefícios metabólicos e hormonais que a ausência de alimentação temporária traz para nosso organismo.

"A diferença entre restrição calórica e jejum

The difference between calorie restriction and fasting – Fasting 27
by Jason Fung

Talvez uma das perguntas mais comuns que recebemos é qual é a diferença entre a restrição calórica e o jejum. Muitos entusiastas da teoria das calorias dizem que o jejum funciona, mas apenas porque ele restringe as calorias. Essencialmente, eles estão dizendo que apenas a média importa, não a frequência. Mas, é claro, a verdade não é nada disso. Então, vamos lidar com este problema espinhoso. 

O tempo em Death Valley, Califórnia deve ser perfeito com uma temperatura média anual de 25° Celsius. No entanto, a maioria dos moradores dificilmente chamaria a temperatura de maravilhosa. Os verões são escaldantes, e os invernos são desconfortavelmente frios. 

Você pode facilmente se afogar cruzando um rio que, em média, tem apenas 60 cm de profundidade. Se a maioria do rio tem apenas 30 cm de profundidade e uma parte dele tem 3 metros de profundidade, então você não vai atravessar com segurança. Saltar uma parede de 30 cm 1000 vezes é muito diferente de saltar uma parede de 300 m uma vez.

Em uma semana de tempo, há uma enorme diferença entre ter 7 dias nublados, com 25 ml de chuva cada, e ter 6 dias ensolarados lindos com 1 dia de chuva pesada. 

É óbvio em todos esses exemplos que as médias gerais dizem apenas uma parte da história, e muitas vezes, entender a frequência é primordial. Então, por que iríamos supor que a redução de 300 calorias por dia durante uma semana é o mesmo que reduzir 2100 calorias em um único dia? A diferença entre os dois é o divisor entre o sucesso e o fracasso. 

A estratégia de controle das porções da redução calórica constante é a abordagem dietética mais comum recomendada pelas autoridades nutricionais para perda de peso e diabetes tipo 2. Os defensores sugerem que a redução do consumo calórico diário em 500 calorias provocará perda de peso de aproximadamente um quilo de gordura por semana. 

A principal recomendação dietética da Associação Americana de Diabetes [ADA] sugere que “se concentre na dieta, na atividade física e nas estratégias comportamentais para atingir um déficit de energia de 500-750 kcal / dia”. O conselho de ‘controle das porções’ para reduzir calorias tem sido o padrão desde a década de 1970. Esta redução equivale às calorias médias que devem ser divididas consistentemente ao longo do dia, ao invés concentrar tudo em uma vez. 

Nutricionistas muitas vezes aconselham os pacientes a comer quatro, cinco ou seis vezes por dia. Existem etiquetas de calorias nas refeições do restaurante, alimentos embalados e bebidas. Existem gráficos para a contagem de calorias, aplicativos de contagem de calorias e centenas de livros de contagem de calorias. Mesmo com tudo isso, o sucesso é tão raro quanto a humildade em um urso pardo.

Afinal, quem não tentou a estratégia de perda de peso do controle das porções? Funciona? Quase nunca. Dados do Reino Unido indicam que o conselho convencional funciona para 1 em 210 homens obesos e 1 em 124 mulheres obesas (4). Isso representa uma taxa de fracasso de 99,5%, e esse número é ainda pior para a obesidade mórbida. Assim, não importa no que você possa acreditar, a redução calórica constante NÃO funciona. Este é um fato empiricamente comprovado. Pior, também tem sido provado nas lágrimas amargas de um milhão de pessoas que acreditavam. 

Mas por que não funciona? Pela mesma razão pela qual os concorrentes do programa The Biggest Loser não conseguiram manter seu peso - desaceleração metabólica. 

Modo de inanição

The Biggest Loser é um reality show de TV americano de longa duração que desafia concorrentes obesos um contra o outro em uma tentativa de perder mais peso. O regime de perda de peso é uma dieta com restrição calórica calculada para ser aproximadamente 70% de suas necessidades energéticas, tipicamente 1200-1500 calorias por dia. Isto é combinado com um regime de exercício intensivo tipicamente bem mais do que duas horas diárias. 

Este é a abordagem clássica “Eat Less, Move More” [Como menos, se exercite mais] aprovada por todas as autoridades nutricionais, razão pela qual a dieta The Biggest Loser está classificada em terceiro lugar no ranking das melhores dietas de perda de peso de 2015 da USA Today. A perda de peso média da temporada foi de 127 quilos ao longo de 6 meses. Funciona a longo prazo? A concorrente da segunda temporada, Suzanne Mendonca, falou tudo quando afirmou que nunca há um show de reunião dos antigos participantes porque “estamos todos gordos novamente”. 

Suas Taxas Metabólicas Basais (TMB), a energia necessária para manter o coração bombeando, os pulmões respirando, o pensamento de seu cérebro, os seus rins desintoxicando, etc., caíram como um piano de um edifício de 20 andares. Durante seis meses, seu metabolismo basal diminuiu em média 789 calorias. Simplificando, eles queimam 789 calorias a menos por dia todos os dias. 

Quando o metabolismo cai, ocorrem platôs de perda de peso. A redução calórica força o corpo a desligar, a fim de coincidir com a ingestão calórica reduzida. Uma vez que os gastos caem abaixo da ingestão, você começa o tão familiar reganho de peso. Ba Bam! O peso é recuperado apesar da complacência dietética com a restrição calórica e até mesmo como seus amigos e familiares silenciosamente o acusando de estar “trapaceando” na dieta. Adeus show de reunião. Mesmo após seis anos, a taxa metabólica não se recupera. 

Tudo isso é completamente previsível. Esta desaceleração metabólica tem sido cientificamente comprovada há mais de 50 anos. Na década de 1950, o Dr. Ancel Keys, no famoso estudo Minnesota Starvation, colocou voluntários em uma dieta de “semi-inanição” de 1500 calorias por dia. Isto representou uma redução calórica de 30% da sua dieta anterior. Em resposta, a sua taxa metabólica basal caiu cerca de 30%. Eles se sentiam com frio, cansados ​​e famintos. Quando eles retomaram sua dieta típica, todo o seu peso retornou. 

Dietas de restrição calórica só funcionam no curto prazo, antes do metabolismo basal responder. Isso às vezes é chamado de “modo de inanição”. A restrição calórica diária fracassa porque infalivelmente coloca você em desaceleração metabólica. É uma garantia. Reverter o diabetes tipo 2 depende da queima do excesso de glicose do corpo, portanto, a dieta de restrição calórica diária não funcionará. 

O segredo para a perda de peso a longo prazo é manter seu metabolismo basal. O que não o coloca em modo de inanição? Inanição real! Ou pelo menos a versão controlada, o jejum intermitente. 

O jejum desencadeia numerosas adaptações hormonais que não acontecem com redução calórica simples. A insulina cai, ajudando a prevenir a resistência à insulina. A noradrenalina sobe, mantendo o metabolismo alto. O hormônio do crescimento aumenta, mantendo a massa magra. 

Durante quatro dias de jejum contínuo, o metabolismo basal não cai. Em vez disso, aumentou 12%. Nem a capacidade de exercício, medida pelo VO2, diminuiu, mas sim foi mantido. Em outro estudo, vinte e dois dias de jejum intermitente diário também não resulta em qualquer redução na TMB. 

Por que isso acontece? Imagine que somos homens das cavernas. É inverno e a comida é escassa. Se nossos corpos entrassem em “modo de inanição”, então ficaríamos letárgicos, sem energia para sair e encontrar comida. Cada dia a situação pioraria e, eventualmente, morreríamos. Agradável. A espécie humana teria sido extinta há muito tempo, se nossos corpos desligassem cada vez que não comemos por algumas horas. 


Não, em vez disso, durante o jejum, o corpo abre o seu amplo suprimento de alimento armazenado – a gordura corporal! Yeah! O metabolismo basal permanece alto e, em vez disso, mudamos as fontes de combustível dos alimentos para os alimentos armazenados (ou gordura corporal). Agora temos energia suficiente para sair e caçar algum mamute lanoso. 

Durante o jejum, primeiro queimamos o glicogênio armazenado no fígado. Quando ele termina, usamos gordura corporal. Oh, hey, boa notícia - há muita gordura armazenada aqui. Queime, querido, queime. Uma vez que há uma abundância de combustível, não há razão para o metabolismo basal cair. E essa é a diferença entre perda de peso a longo prazo e uma vida de desespero. Esse é o divisor entre o sucesso e o fracasso. 

O jejum é eficaz onde a simples redução calórica não é. Qual é a diferença? A obesidade é um desequilíbrio hormonal, não calórico. O jejum fornece mudanças hormonais benéficas, que acontecem durante o jejum mas são totalmente evitadas pela ingestão constante de alimentos. É a intermitência do jejum que o torna muito mais eficaz. 

Jejum intermitente versus restrição calórica 

As adaptações hormonais benéficas que ocorrem durante o jejum são completamente diferentes da simples restrição calórica. A redução da insulina e da resistência à insulina no jejum intermitente desempenha um papel fundamental. 

O fenômeno da resistência não depende apenas da hiperinsulinemia, mas também da persistência desses níveis elevados. A natureza intermitente do jejum ajuda a prevenir o desenvolvimento da resistência à insulina. Manter os níveis de insulina baixos por longos períodos de tempo impede a resistência. 

Estudos compararam diretamente a restrição calórica diária com o jejum intermitente, mantendo a ingestão calórica semanal semelhante. Uma dieta de 30% de gordura no estilo dieta mediterrânea, com restrição calórica diária constante, foi comparada à mesma dieta com restrição severa de calorias em dois dias da semana. 

Durante seis meses, peso e perda de gordura corporal não diferiram. Mas havia importantes diferenças hormonais entre as duas estratégias. Os níveis de insulina, principal fator de resistência à insulina e obesidade a longo prazo, foram inicialmente reduzidos em uma restrição calórica, mas logo se estabilizaram. 

No entanto, durante o jejum intermitente, os níveis de insulina continuaram a cair significativamente. Isto leva à melhora da sensibilidade à insulina apenas com o jejum, apesar da ingestão calórica total semelhante. Uma vez que o diabetes tipo 2 é uma doença de hiperinsulinemia e resistência à insulina, a estratégia de jejum intermitente terá sucesso onde a restrição calórica não tem. É a intermitência da dieta que a torna eficaz.


Recentemente, um segundo estudo comparou diretamente um jejum de dias alternados com zero calorias e restrição calórica diária em adultos obesos. A estratégia de Redução Calórica como Hipótese Primária (CRaP - Caloric Reduction as Primary) foi projetada para subtrair 400 calorias por dia das necessidades energéticas estimadas dos participantes. O grupo ADF comeu normalmente nos dias de alimentação, mas comeu zero calorias nos dias de não alimentação. O estudo durou 24 semanas.

Quais foram as conclusões? Primeiro, a conclusão mais importante foi que esta era uma terapia segura e eficaz que qualquer um poderia razoavelmente seguir. Em termos de peso perdido, o jejum se saiu melhor, mas apenas marginalmente. Isso é consistente com a maioria dos estudos, onde, a curto prazo, qualquer dieta decente produz perda de peso. No entanto, o diabo está nos detalhes. A perda de gordura no tronco, que reflete a gordura visceral mais perigosa, foi quase duas vezes mais com jejum do que com restrição calórica. Na massa gorda %, a quantidade de perda de gordura é quase 6 vezes (!) mais usando o jejum.

A outra grande preocupação é que o jejum vai ‘queimar músculo’. Alguns oponentes alegam (sem qualquer prova) que você perde 1/4 de quilo de músculo por cada dia de jejum que você faz. Considerando que eu faço jejum pelo menos 2 dias por semana, e tenho feito isso por anos, eu estimo que minha porcentagem de músculo deve ser apenas cerca de 0%, e eu não deveria ter músculo suficiente para digitar estas palavras. 

Engraçado como isso não aconteceu. Mas, afinal, o que aconteceu nesse estudo? O grupo da restrição calórica perdeu quantidades estatisticamente significativas de massa magra, mas não o grupo do jejum intermitente. Sim, há MENOS perda de massa muscular magra. Talvez tenha a ver com todo o hormônio do crescimento e noradrenalina sendo bombeados. 

A massa magra aumentou em 2,2% com jejum e apenas 0,5% com restrição calórica. Em outras palavras, o jejum é 4 vezes melhor na preservação da massa magra. Então chega desse velho ‘jejum queima o músculo’. 

O que acontece com o metabolismo basal? Isso é o que determina o sucesso a longo prazo. Se você olhar para a alteração na taxa metabólica basal (TMB). Usando restrição calórica, o metabolismo basal caiu 76 calorias por dia. Usando o jejum, ela só caiu 29 calorias por dia (que não é estatisticamente significativo em relação à linha de base). Em outras palavras, a redução calórica diária causa quase 2 1/2 vezes mais desaceleração metabólica do que o jejum! Então chega desse velho ‘jejum coloca você em modo de inanição’.

O jejum tem sido usado ao longo da história humana como um método tremendamente eficaz de controlar a obesidade. Em contraste, a estratégia de controle das porções de restrição calórica diária só foi recomendada nos últimos 50 anos com um fracasso impressionante. No entanto, o aconselhamento convencional para reduzir algumas calorias todos os dias persiste e o jejum é continuamente depreciado como uma prática desatualizada, perigosa, semelhante à sangria e ao voodoo. O estudo relata que “importante, ADF [jejum intermitente] não foi associado com aumento do risco de reganho de peso”. OMD***. Esse é o Santo Graal, cara! Todo o problema da obesidade e do The Biggest Loser é o REGANHO DE PESO, não a perda de peso inicial. 

A recuperação de peso diferiu durante o jejum versus a restrição calórica. O grupo do jejum tendeu a recuperar massa magra e continuar a perder gordura, enquanto grupo da restrição calórica ganhou massa gorda e magra. Parte do problema foi que o grupo do jejum relatou que muitas vezes continuaram a jejuar, mesmo após o estudo acabar. Claro! É mais fácil do que eles pensavam, porém, com melhores resultados. Só um idiota pararia. 

Uma das coisas mais fascinantes é que a grelina (o hormônio da fome) aumenta com restrição calórica, mas NÃO durante o jejum. Sabemos que a dieta faz com que você sinta fome. Não é uma questão de força de vontade - é um fato hormonal da vida – a grelina sobe e você fica com mais fome. No entanto, o jejum não aumenta a fome. Fascinante. Não admira que seja mais fácil manter o peso perdido! Você sente menos fome. 

As dietas de restrição calórica ignoram o princípio biológico da homeostase - a capacidade do corpo de se adaptar a ambientes em mudança. Seus olhos se ajustam se você estiver em um quarto escuro ou sob luz solar brilhante. Seus ouvidos se ajustam se você estiver em um aeroporto barulhento ou em uma casa tranquila. 

O mesmo se aplica à perda de peso. Seu corpo se adapta a uma dieta constante, retardando o metabolismo. Dieta bem sucedida requer uma estratégia intermitente, não constante. Restringir parte dos alimentos o tempo todo (controle das porções) difere de restringir todos os alimentos parte do tempo (jejum intermitente). Esta é a diferença crucial entre o fracasso e o sucesso. 

Então aqui estão suas escolhas: 
1.      Restrição calórica: menos perda de peso (ruim), mais perda de massa magra (ruim), menos perda de gordura visceral (ruim), mais difícil de manter o peso, mais fome (ruim), mais fadiga (ruim), mais fome (ruim), insulina mais alta (ruim), mais resistência à insulina (ruim), histórico de 50 anos sem sucesso (ruim). 
2.      Jejum intermitente: Mais perda de peso, mais ganho de massa magra, mais perda de gordura visceral, menos fome, menor insulina, menos resistência à insulina, vem sendo usado ao longo de toda a história humana. 
Quase toda a sociedade médica, médicos, nutricionistas e os principais meios de comunicação irão dizer-lhe para usar a escolha #1. Eu prefiro dizer às pessoas para usarem a escolha #2."

Fonte e tradução: blog Resistência à Insulina.

Artigo original aqui.

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